quinta-feira, 20 de agosto de 2015

ROBERTO MIRANDA

Por onde anda? O vendaval Roberto Miranda

ANOS 60 (SESSENTA)


Aos 70 anos, atacante que brilhou pelo Botafogo mostra a mesma disposição dos tempos que infernizava as defesas

                                        


POR MARCIA VIEIRA
Rio - Ele não fugia do pau, era veloz como o vento, e tinha no sangue a marca do artilheiro. Não foi à toa que ganhou do inesquecível radialista Valdir Amaral o apelido de “Vendaval”. 
Uma metáfora, que definiu com propriedade o estilo rompedor de Roberto Miranda, que fez história no Botafogo no final dos anos 1960. 
Foram 12 anos marcados com a conquista de títulos importantes, como dois Rio-São Paulo (1964 e 1966), o bicampeonato carioca 1967-1968 e a Taça Brasil de 1968.
Foram154 gols em 352 jogos, o nono maior goleador do clube. 
Com a mesma entrega, Roberto também jogou no Flamengo,Corinthians e Seleção, antes de se aposentar aos 33 anos por causa de uma série de lesões no joelho. 
Hoje, aos 70 anos, o ex-jogador continua vivendo do futebol. Participa de eventos, dá palestras e descobriu uma nova paixão em Niterói, onde vive.
“As cinco da manhã vou para a academia e aproveito para malhar. Sou viciado em exercícios
Vou dormir pensando nisso. Fico até uma hora e meia na academia e ainda malho aos sábados. 
Tive uma ruptura do ligamento cruzado que me fez encerrar a carreira. 
Por causa disso o médico me orientou a pegar peso para fortalecer o músculo. 

Fiz tanto que não parei mais”, entrega.
Quem o viu em ação sabe o motivo de tantas lesões. Raçudo, 
Miranda não acreditava em bola perdida, o que lhe rendeu um extenso prontuário médico com direito a rompimento do tendão de aquiles e fraturas nas costelas, braço,clavícula e queixo, além de um grave problema no joelho:

“Era meu estilo,desde o juvenil. Os técnicos sempre falavam para não dar as costas para o adversário para não apanhar. 
Com o tempo aprendi, mas apanhei muito e também bati tinha que me defender”.
Depois de uma passagem brilhante pelo Botafogo, se transferiu para o Flamengo onde jogou apenas 11 jogos. 
Após brigar com o técnico Yustrich, por pouco não voltou para General Severiano: 
“A gente brigava, mas ele gostava da minha entrega em campo, eu era um exemplo para os jogadores. Tanto que foi ele quem me levou para o Corinthians”.
Trocado pelo lateral Miranda, o atacante chegou ao Parque São Jorge em 1973. 
Fez apenas 77 jogos até 1976, quando uma cirurgia mal sucedida abreviou sua carreira:
“São setenta anos bem vividos, atingi o topo no futebol. Não tenho nada a reclamar”
INSPIRADO NO POSSESSO E FÃ DE FRED
Cria do Botafogo, Roberto Miranda viu de camarote a melhor safra de jogadores da história do clube. 
Por morar debaixo da antiga arquibancada de General Severiano, ele assistia diariamente ao treino de craques como Garrincha, Didi, Quarentinha, Amarildo, entre outros. 
1970
E foi Amarildo sua maior inspiração. “Eu me espelhei muito no Possesso, que logo foi vendido para o Milan. Gostava muito do estilo dele, era muito rápido como eu”, relembra.
Perguntado se algum jogador de hoje teria o seu estilo, Miranda responde: “ Acho que o Fred tem alguma coisa parecida na hora do gol. 
Mas eu voltava mais do que ele, deslocava mais”.
CAMPEÃO DO MUNDO GRAÇAS A ZAGALLO
Roberto Miranda orgulha-se de ter disputado a Olimpíada de 1964, no Japão, e de ter feito parte do grupo que conquistou o tri mundial no México, em 1970. 
Um título que ele jamais teria no currículo se o técnico João Saldanha não tivesse sido trocado por Zagallo: “Eu tinha uma diferença com o Saldanha desde o juvenil do Botafogo, quando me recusei a fazer uma jogada, que ele pediu. Pouca gente sabe disso”.
Mas com a saída de Saldanha tudo mudou.
 “Um dia, ele foi cercado pela imprensa no treino, em General Severiano.
 Depois ele pediu para sair do treino. Estranhei, mas quando cheguei ao vestiário fiquei sabendo da minha convocação”.
Ele fez 18 jogos pela Seleção e marcou nove gols. 
Na Copa de 70, entrou apenas nos jogos contra Inglaterra e Peru: “Joguei em uma época que só tinha feras. 
Fui reserva do melhor jogador do mundo. Uma honra”.
“Sou campeão mundial”, entendeu? O pessoal chamando: “Sobe para receber a medalha e o pessoal nem estava ligando de medalha. 
Estava festejando porque a torcida entrou em campo. 
Os mexicanos entraram em campo e você foi obrigado a correr para o vestiário, porque os caras iam te arrancar tudo.
Aí depois tinha o André Richer que era o presidente do Flamengo, o Xisto Toniato do Botafogo, vice-presidente. 
As rendas deram uma caída. Então eles falam: “Roberto, tem uma jogada aí”. Eu digo: “Qual é a jogada?”. 
“É assim, você vai para o Flamengo por um campeonato e vem o Brito e o Paulo Henrique para o Botafogo”. 
“Tudo bem”. Aí eu fui para o Flamengo e disputei um campeonato. 
A renda volta a subir e eu volto para o Botafogo. 
Aí fiquei no Botafogo. Aí de repente veio o... O espanhol do Corinthians... 
Matheus,Vicente Matheus: “Roberto, o Vicente Matheus vem jantar com a gente hoje e ele quer falar com você”. 
Era para me comprar. “Tudo bem”. Aí ele começa a falar: “Ado, Zé Maria, Baldochi, Rivelino pediram para pegar você”. 

1971
Eu digo: “Não é você que me quer não? São eles?”, eu ainda brinquei com ele. [riso] “Não, somos nós”. “Está bom, vamos aí”. 

Vai dar grana na mão. “Ta, tudo bem”. Aí eu fui para o Corinthians. Estreei contra o Flamengo e fiz logo o primeiro gol, ganhamos de três a zero em um amistoso. 
Para me apresentar no Pacaembu eu fiz um gol. Aí fiquei no Corinthians.
Mas você não criou um laço mais profundo com o Flamengo?  
Não, não, ali foi mesmo profissional. Ali fui como profissional.  
Aí vai ter essa mudança primeiro: Botafogo-Flamengo e depois volta para o Botafogo.
 Mas aí vai ter uma outra mudança também que é futebol cariocafutebol paulista. 
Sua chegada no Corinthians, qual foram os pontos que você viu de diferentes, o que mudou?  
A diferença foi o seguinte, é que eu fui bem tratado no Corinthians, muito bem tratado. 
Inclusive, eu andava na rua e pô, as pessoal me adorava. 
A torcida do Corinthians se identificou logo comigo, pelo meu tipo de jogo: eu era um cara que ia, batalhava pelo jogo. 
Inclusive no campeonato nós estreamos contra... 

Eu joguei contra a Ponte Preta... Eu fazia muitos gols no Corinthians também. 
Contra o América de Rio Preto, também que tinha dois negões. 
Eu fui lá, encarei eles e ganhei o jogo. Então, na rua, eu era um cara que me dava muito. 
Apesar de que eles eram muito exigentes com muitos jogadores no Corinthians. 
E quando eu peguei o Corinthians, o Corinthians era o Ado, Zé Maria, Baldochi, Luís Carlos, Wladimir, Adãozinho, Rivellino, Vaguinho, eu e Marco Antonio. 
Porra, era um time de quase seleção. Só que o Corinthians não dava sorte. 
Nós ganhávamos de time grande, perdíamos para time pequeno, empatávamos com time pequeno. 
Aí que tá, não pode. A gente era time grande.
E tem grandes diferenças? Ou quais as grandes diferenças que você identifica do futebol do Rio para o futebol de São Paulo? 
1972
 Olha, eu não sei porque o Corinthians não era campeão há vários anos. 
Quando eu cheguei, apesar de ter jogadores de nível de seleção, às vezes eles ficavam afobados, eles tinham aquela obrigação de ganhar. 
Eu sentia isso neles: “Nós somos obrigados a ganhar”. 
“Não é obrigado gente, eu não convivi com vocês esse tempo. 
Eu vim de time que quase todo ano ganhava o título. 
Então eu sou acostumado, não vou entrar nessa de vocês”. 

Então senti isso dentro de campo: era obrigado a ganhar.
 Às vezes errava a jogada porque era aquela afobação: 
“não, não, vamos”. Não pode, tem que ir com calma. Tá entendendo?  
E a vida em São Paulo mesmo? Você sai com sua família de Niterói e vai para lá viver em São Paulo?  
Não, a única coisa é que fazia sol de manhã, chovia daqui a pouco, fazia outro sol. 
Eu saia com guarda-chuva, né? Aí de repente um sol e eu de guardachuva? Era só isso. 
Mas depois eu me acostumei, apesar de que eu morava um pouco distante, não é? 
 Em São Paulo você vira Roberto Miranda, não é?  
Por causa do Roberto Rivellino, entendeu?  
O nome é Roberto, então colocou Roberto Rivelino e Roberto Miranda, para não ser só Roberto.  
Mas quando eu te perguntei sobre diferenças do futebol do Rio para São Paulo, é que sempre existe esse comentário que o futebol do Rio é mais lento, mais cadenciado. 
No sul do país ele é mais corrido, é mais disputado. Em São Paulo você sentiu alguma diferença de estilo de jogo propriamente? 
 Dentro do campo, não é?  Dentro de campo? Não, tinha...Ali vai muito... 
Porque tinha jogos que era bem mais corrido e tinha jogos que era tranquilo. 
1973
Aí vai de muito de partida para partida. No Rio, por exemplo, joguei a minha vida toda quase no Rio. 
Então falava: “se você quer ser convocado, vai jogar em um clube do Rio”. 
Se falava que os melhores jogadores estão no Rio de Janeiro, é a vitrine. Mas que nada, tinha bons jogadores. 
É a forma de se conduzir. Em Minas tem grandes jogadores, saiu grandes jogadores de Minas... São Paulo. 
É isso, eu nunca fui...portanto, eu cheguei a disputar negócio de seleção carioca, mineira, paulista. 
Nós, inclusive, fizemos um jogo para a rainha Elizabeth aqui no Maracanã. 
Ela veio ver e não teve nenhum gol para ela, empatamos em zero a zero. [riso] 
A seleção paulista veio com tudo: Rivellino, Pelé. 
Aquela camisa linda da seleção paulista, aquela riscadinha preto e branca com a bola Transcrição 35 vermelha. 
E a nossa era azul com um triangulo e calção branco. 
Lotou o Maracanã e a rainha não viu um gol sequer.
 Mas quando você diz assim: “Estourei”, foi em um jogo que você cai e sai...?  Não, foi uma pancada que eu tomei em dois jogos. 
O corpo cai por cima do joelho e ele dá um estalo. E depois eu fui pular, gol cavalete, e o campo estava escorregando, tinha chovido, aí minha perna faz assim. 
Aí estourou tudo. Mas eu estava com ele arrebentado. Ali para ver se estava bom mesmo. 
Eu fiquei em cima de uma perna só, pra ver se tava...Aí que não tinha mais perna, não tinha mais nada. 
Eu notei, eu digo: “Acabou futebol”. Eu senti: “Não dá mais para jogar”.  Aí você encerra no Corinthians?  Encerrei no Corinthians.  

E como foi para você, Roberto, chegar a essa decisão? Quer dizer, a decisão, na verdade, chegou para você, não foi você quem tomou a decisão. 
Mas a sensação de que “não vou à Copa e vou parar de jogar futebol”, que provavelmente era coisa que você mais gostava de fazer, não é?  
Você sabe que eu gostava tanto de jogar futebol que às vezes eu sonho que estou em campo. 
Eu acordo... Estou sonhando que vou fazer essa jogada, quando eu... “Não estou jogando mais”, eu acordo. Para você ver como funciona a coisa, como eu gostava tanto de jogar. 
Eu machucado, eu pensava: “pô, vou cuidar isso assim, vou fazer isso”. Depois: “Eu não poder mais jogar”. 
Estava tudo Transcrição 36 enfaixado, tudo engessado. Doutor Osmar falava mesmo: “Não adianta, você não vai poder mais jogar”.  
1974

Você sabia que não ia mais ter chance de voltar, o médico te falava ou você sabia?  Fizeram uma junta médica. Eu já sabia. 
Pelo o que eu sentia, eu já sabia: não dá mais. 
A minha perna sai... 
1975
Essa parte de baixo sai lá de cima, eu tiro com a mão. E sinto dor até hoje. Eu estou na academia para amortecer a dor. 
Eu tenho que fazer exercício todos os dias, levantar um pouco de peso. O músculo que faz você diminuir a dor. 
Mas nem isso estava adiantando mais. Eu tenho que fazer outra cirurgia. A minha perna abriu, aí que dói. 
Sabe quem me aposentou? Doutor Osmar de Oliveira. Eu sou um jogador aposentado pelo INSS. Primeira coisa que ele disse: “Não, você vai se aposentar”. 



FONTE DAS IMAGENS
http://odia.ig.com.br/
Revista Placar(Editora Abril)
Revista Grandes Clubes Brasileiros
Jornal O Globo
Gazeta Press
Revista do Esporte

FONTE DOS TEXTOS
http://odia.ig.com.br/
FUNDAÇÃO GETULIO VARGAS CENTRO DE PESQUISA E DOCUMENTAÇÃO DE HISTÓRIA CONTEMPORÂNEA DO BRASIL (CPDOC)




















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